Udhi Jozzolino: patrimônio vivo da arte londrinense
Apaixonada pela vida, a artista cujas obras estão no acervo do Museu de Arte de Londrina compartilha sua trajetória e fala sobre suas motivações
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“Dizem que comigo é para tomar cuidado. Sou patrimônio vivo”, diz Udhi Jozzolino.
Aos 86 anos, ela é parte da memória cultural e artística da cidade de Londrina. Educadora e artista plástica, a pintora cujas obras fazem parte do acervo do Museu de Arte de Londrina (MAL) é uma verdadeira explosão de cor e paixão pela vida. Manteve-se assim durante toda a sua extensa carreira, seja dentro da sala de aula ou em suas telas.
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A arte sempre ocupou lugar fundamental na vida de Jozzolino, conhecida por seu estilo leve e sua mescla de técnicas, incluindo pintura a óleo, desenho e colagem. A pintora é uma das personalidades que integram a série Biografias Audiovisuais, produzida pelo Museu de Arte de Londrina e pela Secretaria Municipal de Cultura (SMC). Composta por entrevistas em vídeo com importantes artistas cujos trabalhos integram o Museu de Arte, a série pode ser conferida no canal de YouTube Londrina Cultura e no perfil de Instagram da SMC.
Trajetória – Lourdes Aparecida Jozzolino é natural de Pirangi, município do interior de São Paulo. Desde pequena, sempre foi apaixonada pela arte. Quando menina, se mudou para Rolândia e, na sequência, para Curitiba, para estudar em um colégio interno.
“Meu pai me matriculou na aula de piano, mas eu sou péssima em música. Nunca fui a uma única aula. Eu, da minha alta recreação, troquei as aulas de piano pelas de pintura. Saí do colégio sabendo pintar, mas não sei nem onde fica o dó no teclado”, relembra.
Em 1963, cursou Bacharelado e Licenciatura na Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Londrina, órgão que se tornaria a Universidade Estadual de Londrina. Em 1981, a UEL a receberia novamente, dessa vez como docente. A mestra-artista deu aula para a primeira turma de Design Gráfico da Universidade, foi chefe de departamento, coordenadora de curso e, após diversas contribuições para o ensino, se aposentou em 2000.
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Ainda na juventude, aos 28 anos, Jozzolino entrou em uma batalha que vem travando durante toda a sua vida. Foi diagnosticada com esclerose múltipla, uma doença neurológica crônica. “Fiquei paralisada do lado direito, em cima de uma cama, e perdi a habilidade do desenho, perdi o movimento da linha. Mas eu tinha um amigo que, em 1997, disse: ‘o desenho não está na mão, o desenho está na cabeça. Ache outra coisa para você fazer’”, relata.
E a artista encontrou. Passou a se aventurar na pintura e na colagem. “Até hoje eu não sei se minha colagem é uma pintura, ou se eu pinto colagens. A colagem depende da cor, e é a cor que dá vida ao que eu faço”, destaca.
Segundo ela, a esclerose múltipla pode limitar sua mobilidade, mas jamais sua criatividade e visão de mundo.
Amarelo cor do céu – Diferentes texturas, suportes, formas e cores são constantes na arte de Jozzolino. “Acabou o amarelo e o laranja da minha caixa de lápis de cor, preciso comprar mais”, diz, entre risos.
O amarelo, que pode transmitir alegria, felicidade, energia e clareza mental, é velho companheiro dela. Das três obras com sua assinatura que compõem o acervo do Museu de Arte de Londrina, uma das mais icônicas e memoráveis é justamente “Paisagem Amarela”, tela doada em 2004.
Tanta vibração e emoção transformam as telas quase em espelhos. Jozzolino elabora trabalhos que a refletem como artista e como pessoa. Ela conta que, muitas vezes, o público se surpreende com essa relação desenhada em suas obras.
“Durante um festival de teatro, eu fiz uma exposição no saguão do Ouro Verde, sozinha, com 56 trabalhos. Um dos diretores de teatro chegou na escada e falou ‘o que é isso?’. Disseram que era ‘a exposição da Udhi’. Ele perguntou: ‘A Udhi tem quantos anos, 15? Isso é a mentalidade de um jovem’. Ele ficou louco ao ver toda aquela cor. Meu trabalho é cor”, salienta.
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Um chamado à vida – Sentada confortavelmente, a entrevistada conversou com leveza sobre sua história. Na parede, um letreiro anuncia a importância do ambiente da conversa: “Sala Profª Udhi Jozzolino. Arte, alimento para a alma”. O espaço, que preserva vários de seus trabalhos, fica no ateliê de Yoshiya Nakagawara, artista e amiga de longa data de Jozzolino.
Entre exposições conjuntas, cafés da tarde e uma amizade duradoura, as duas pintoras podem ser inseparáveis, mas têm personalidades completamente diferentes. “Ela é japonesa, introspectiva, e eu sou calabresa, não tenho nada de introspectivo; minha vida é aberta. Para mim, a vida tem que ser alegre”, diz Jozzolino.
E é assim que ela leva a vida e oferece sua arte ao público. Com leveza. “Hoje, arte e pintura é a única coisa que eu faço. Eu tenho 86 anos, cruzei a minha vida com esclerose múltipla, uma doença degenerativa. Era para eu estar em cima de uma cama, esperando a morte. Vida só tem uma. Nem sei se eu sou artista, diz o povo que eu sou”, conclui, com um sorriso no rosto.
Texto: Maria Dalben, sob supervisão dos jornalistas do Núcleo de Comunicação da Prefeitura de Londrina.